Surgiu de maneira inusitada, após um flerte na roda de bamba;
A inocência daquela cabrocha rendeu-se ao frenético batuque do tamborim...
E mais intenso foi o olhar direcionado ao maior andarilho das redondezas...
Poderia iniciar-se daí, história de amor...
Mas, não passou de uma noite;
E a magia veio a esvair-se junto com o par de sapatos brancos
Com aquele lento abrir e fechar da porta...
Sequência de fatos que bastou pra selar a vinda ao mundo de Alcides...
Nasceu desprovido de luxo, no barraco 15 da ladeira...
E mesmo desapontado com pela figura masculina na qual devia espelhar-se,
Manteve os genes de suas origens;
Notava-se a semelhança com o tal malandro que o abandonaste,
E perante as adversidades, tornou-se um guri requisitado;
Dominante na arte de fazer travessuras,
Criativo dentro das limitações existentes no cortiço;
Qualidades adentraram o passar dos anos
E logo o moleque descobriu sua verdadeira e genética vocação...
Apesar de ser tentado por maneiras ilícitas de viver...
Conheceu a cadência e logo rendeu-se a marcação...
E nesta convivência assídua, evoluía na avenida;
Seus dons o fizeram um mestre do samba...
Alcides agora vivia apenas nas veias e em pedaços de papel;
Cidinho da Ladeira era quem desfilava em bares e becos...
Se bem que, boemia, encaixaria bem em seu sobrenome
Já que a sua Ternura tinha hora marcada pra buscá-lo na birosca...
Aliás, Glorinha tinha atributos medicinais;
A única que curava efeitos da superdosagem etílica do seu Nego...
Mas, sua vida de excessos encurtava cada vez mais seus caminhos
E seus talentos seguiam em decadência sem possibilidade de retorno...
Sua vida, repleta de acontecimentos únicos,
Parecia não ter sentido a medida em que se aproximava do fim...
O corpo antes forte, reclamava seus males
E o prejudicial foi predominante pra que ele percebesse o quanto era vulnerável...
Os que antes o acompanhavam, eram os mesmos que lhe viravam as costas...
Foi aí então que ele percebeu que mesmo ser ter conhecido o tal homem,
Teve sua história feito cópia da jornada daquele saltimbanco que o fez...
E num dia cinzento, Cidinho acorda lá pelas onze,
Dá um beijo na Preta como se fosse o último; e era...
Desceu a ladeira, que lhe deu o pseudônimo... Lentamente...
Foi de encontro ao velho botequim,
O mesmo onde mantinha a décadas a mesma pendura...
Lançou mão de seu instrumento musical,
E mais uma vez iniciou a rotina que lhe deu fama e respeito;
Sob olhares atentos e aplausos entusiasmados,
Fazia o choro sair de cordas através de seu dedilhado
E as lágrimas emotivas a escorrerem no seu rosto enrugado...
Subitamente, durante a roda, as atenções desviaram-se...
Uma forte brisa soprou a oeste criando calafrios;
Num movimento uniforme, todos se viraram contra a mesa,
E após frações de segundos, perceberam o silêncio...
Eram meio-dia daquele sábado distinto;
Alcides; Cidinho da Ladeira; Boêmio; Moleque; abraçado ao seu cavaco,
Deixava aquela que, o próprio chamava de samba-enredo...
O bamba deixara todos de queixo caído ao deixar a vida...
Apesar do seu traçado até aqui ter sido inconsequente,
Há quem o diga que, pensavam ser um imortal...
Nasceu sem pedir, viveu sem medidas, se foi fazendo o que mais amava...
O eterno Guri se foi mas, o intuito ainda vive;
Também nascemos sem pedir, vivemos nossos excessos, ultrapassamos nossos limites
Mas, nunca devemos deixar de intensificar nossos amores;
Seja um lugar, uma pessoa, um estado, uma ação...
E mesmo que vidas assim como a desse malandro, tenham tido fatos ruins,
Sempre existem um lado claro nas coisas, depende apenas do ponto de vista...
E assim, Cidinho vive pois, mudam-se os personagens e cenários
Mas, a história sempre será a mesma, com início, meio e fim...
Porquê, Alcides é meu pai, é minha mãe, é meu irmão,
É meu amigo, é você...
Alcides sou eu.
DINHO BRITO
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